Directora da Associação Mwana Pwo, na Lunda Sul
Maria Malomalo: Uma guerreira pelos direitos das mulheres
Texto: Ilídio Manuel
Fotos: Arquivo
Foi educada numa instituição religiosa, mais concretamente nas irmãs dominicanas “St Dominics Chishawasha” em Harare, no Zimbabué, a activista Maria Malomalo é uma acérrima defensora dos direitos humanos e em particular dos direitos das mulheres. É uma voz que se levanta na Lunda-Sul, em defesa dos que não têm voz e dos oprimidos.
Com esta homenagem a esta grande heroína da comunidade encerramos a primeira série deste trabalho.
Há 3 anos fundou, em Saurimo, uma das organizações mais interventivas da Lunda Sul, a Associação Mwana Pwo, da qual é sua directora. A instituição tem como objectivo “proteger e promover a saúde sexual e reprodutiva, assim como os direitos de meninas adolescentes e mulheres jovens por meio do desenvolvimento de liderança e educação em direitos humanos e capacitação”, explica a entrevistada.
Casada, mãe de 3 filhos, formada em Jornalismo e Estudos Sociais, Maria Malomalo é o principal rosto da “Mwana Pwó”, uma associação que adoptou o nome de um dos maiores símbolos da cultura lunda-chokwé.
Questionada sobre os motivos que levaram à criação da instituição, diz que a mesma surgiu para dar resposta às elevadas taxas de gravidezes na adolescência na província da Lunda Sul. Socorre-se os dados do Instituto Nacional de Estatísticas, e afirma que a província está entre as que têm as mais altas do país, ou seja, na ordem dos 59,79%.
“O impacto negativo da gravidez na adolescência tem condicionado à vida das meninas, com reflexos em suas famílias e nas comunidades, o que contribui para um ciclo interminável de pobreza”, ajunta.
Descreve o seu trabalho como sendo “incrível” e, por vezes, “emocional”. “Às vezes, lidamos com questões delicadas, desde o trabalhar com meninas que sobreviveram à violência do género até falar com mulheres jovens sobre sexo e sexualidade. Implementamos programas de gestão de saúde sexual, o uso de anticoncepcionais, a educação sexual abrangente e sobre a violência sexual e do género”.
Maria Malomalo diz que acredita desenvolver as capacidades de liderança das meninas porque, segundo a entrevistada, “elas devem ser as autoras de seu próprio desenvolvimento”.
Em relação às principais dificuldades no seu trabalho revelou que um dos principais obstáculos tem sido a aceitação pelas comunidades de questões relacionadas à saúde sexual e reprodutiva das mulheres que é “muito baixa”.
“No início, as pessoas pediam para que falássemos moderadamente, mas com o tempo elas foram-se acostumando com nosso trabalho e linguagem. Também tivemos desafios em que algumas comunidades pensavam que éramos um partido político, uma vez que não estavam acostumadas a lidar com as organizações da sociedade civil” recorda, com alguma tristeza.
“Alguns questionam por que ensinamos a uns jovens a usar preservativos e outros anticoncepcionais. Há pessoas que acreditam que isso aumenta a percentagem de início sexual precoce. No entanto, a realidade é que, com ou sem informação sobre as questões de saúde sexual e reprodutiva, os jovens têm mantido sempre relações sexuais”, ajunta.
Reconhece que os apoios que recebeu, por via das parcerias, ajudaram grandemente para o sucesso do trabalho da organização que dirige. “Construímos grandes parcerias, tanto local como internacionalmente. Localmente, interagimos com o Ondjango Feminista e a Plataforma para Mulheres em Ação que nos auxiliam na conceituação de nosso trabalho, ideias e material”, explicou. Trabalhamos também com a Fundação Open Society, o Fundo das Nações Unidos para População e o Banco de Formento Angolano (BFA). Internacionalmente, somos membros da Girls not Brides, uma parceria global que visa acabar com o casamento infantil, e da FEMNET, um movimento feminista africano. Também recebemos apoios financeiros de Pão para o Mundo Alemanha, explicou.
Revela que o Governo local tem facilitado a execução das actividades de Mwana Pwo e que a organização tem trabalhado em estreita colaboração com o Ministério da Educação durante os programas escolares.
Uma história marcante
Questionada sobre o episódio que mais marcou a sua actividade, contou a caso de uma menina de 15 anos que, em 2019, veio ao seu escritório, a fim de manter uma conversa intensa sobre o aborto.
Conta que a menina em causa estava grávida, e que durante 5 meses escondeu o facto a família, mas acabaria por ser descoberta pela mãe que, entretanto, a expulsou de casa. “Ela procurou protecção em casa de uma tia que a aconselhou a comprar medicamentos, sem receita, para fazer o respectivo aborto”, lembra.
Segundo a entrevistada, os medicamentos ingeridos produziram uma reacção colateral que levaram ao internamento da adolescente num dos hospitais locais, onde viria abortar os bebés de uma gravidez gemelar. “O meu coração sangrou por causa desse episódio triste”, realçou Maria.
Diz ser fã de Hillary Clinton, Chimamanda Adichie, a autora feminista nigeriana, e da apresentadora norte-americana Oprah Winfrey “por causa de seu compromisso com a educação de meninas”, justifica.
Adora ler livros que abordem os direitos da mulher e o feminismo e gosta de escrever nas horas vagas.