Quem percorre as ruas do Lubango dará, certamente, conta das pedras decorativas nas suas calçadas ou do revestimento das fachadas e dos interiores dos edifícios com placas de mármore ou/e granito.
Por detrás da beleza incrustada e do brilho que elas emprestam há um longo e extenuante trabalho que vai desde prospecção, extracção, transporte, corte, ao polimento.
Potencialmente rica em recursos minerais, a Huíla é uma província em que a extracção e comercialização desses minerais têm contribuído para a redução do desemprego e diversificação da nossa economia.
Ilídio Manuel (Textos)
Edson Fortes (Fotos)
Localizada a 133 Km a sul do Lubango, na comuna da Tchibemba, no município dos Gambos, a Rodang é uma das maiores empresas de extracção de rochas ornamentais, senão a maior nessa região, com uma população estimada em mais de 150 mil habitantes.
O município dos Gambos, o último da Huíla em direcção à vizinha província do Cunene, está rodeado de várias montanhas, muitas das quais com enorme potencial comercial.
Depois de ter sido atingido nestes últimos anos por uma seca severa que levou à morte de várias pessoas e à redução da sua população de bovinos, o município dos Gambos dá sinais de recuperação, não só na pecuária, como também na agricultura da subsistência.
Por esta altura do ano, as escavações abertas na berma da estrada asfaltada conservam as águas das chuvas, de cor acastanha, que servem para o abeberamento do gado. As crianças aproveitam a ocasião para nadarem ou brincarem nas águas barrentas nessas espécies de Tchimpacas.
Com minas ou pedreiras espalhadas por várias províncias da região, nomeadamente na Huíla, Namibe e Cunene, a Roldang emprega centenas de trabalhadores, dentre nacionais e estrangeiros, nomeadamente espanhóis, portugueses, brasileiros e zimbabueanos, sendo uma dos maiores fornecedoras de rochas ornamentais na região Sul de Angola, assim como exportadora para os mercados chinês e europeu.
Chega-se à mina da Tchibemba-2 por uma estrada de terra batida, de aproximadamente 1 Km, que levanta pó acastanhado à passagem dos veículos.
Aníbal Cavalheiro Perez, 60 anos, de nacionalidade espanhola, é o encarregado da mina, e reside em Angola há 15 anos, um país que, segundo confessou, “ acolhedor e bom para viver”.
Apesar dos longos anos de estadia em Angola, o tempo não lhe apagou o castelhano para dar lugar à língua português. Expressa-se na língua espanhola, sem “ruídos” no seu relacionamento com os seus subordinados.
Tem a tez queimada pelo sol inclemente que se faz sentir nessa região, marcada por períodos de estiagem prolongados, sem chuvas que arrefeçam as altas temperaturas.
Tem a seu cargo 60 trabalhadores dos mais diversos ramos de actividade, desde administrativos aos técnicos de viaturas e máquinas de extracção e corte de rochas.
Tem uma vasta experiência na exploração de rochas ornamentais, tendo já feito o mesmo trabalho durante vários anos no seu país natal e no Zimbabwe, antes de se fixar no nosso país.
A poucos metros do local onde decorria a nossa conversa, as máquinas movimentavam-se à volta de um enorme maciço de pedra, na qual se procedia à extracção de blocos de mármore, de várias toneladas de peso.
O entrevistado do NJ estima que a exploração da mina tanto na superfície, como nas suas profundezas poderá durar “ 20 anos”.
Diz que a empresa não tem razões de queixa em matéria de equipamentos para a extracção dos minerais, possuindo máquinas de perfuração, corte, retroescavadoras e Caterpillares, dentre outros.
O especialista castelhano lamenta, porém, a falta de peças sobressalentes no mercado nacional, sendo esta obrigada a recorrer ao mercado exterior em caso da avaria dos equipamentos.
Segundo Aníbal Cavalheiro, a Rodang recebe todos os anos a visita de um técnico proveniente do estrangeiro que procede à “revisão de todas as máquinas”.
Em relação à mina, disse que a mesma não era de boa qualidade, uma vez que o mármore que lá se extraia apresentava muitas manchas e riscos que, segundo o entrevistado, reduziam o seu valor comercial.
Segundo o encarregado, os mercados da China e de alguns países da Europa eram os maiores consumidores das rochas lá produzidas.
Revelou que a falta de energia eléctrica da rede pública tem aumentado os custos de produção devido aos custos com os combustíveis, óleos e manutenção dos geradores.
Quanto à água, disse que ela não constituía nenhum problema, visto que a empresa possui um furo subterrâneo de extracção do precioso líquido.
Atribuiu a fraca qualidade da mina à sua textura que, segundo ele, criava muita dificuldade para “extrair 100 metros cúbicos no espaço de um mês».
Em relação à formação do pessoal, o encarregado da mina diz que a mesma tem sido feita no local de trabalho, ou seja, a chamada formação “on job”, e que tem sido ministrada por técnicos locais ou especialistas vindos da Europa.
Questionado sobre a proveniência da mão-de-obra, sublinhou que a prioridade recaia sobre os habitantes locais e que 40 dos 60 trabalhadores eram provenientes do município dos Gambos.
Sobre a responsabilidade social, Aníbal Perez disse que a sua empresa tem ajudado a população local, sobretudo no fornecimento de água para o consumo humano e animal.
Segundo ele, a empresa, quando solicitada, tem respondido positivamente aos pedidos da administração municipal dos Gambos para a terraplanagem das vias.
Da teoria à prática
Silva Germano nasceu no Kwanza Sul há 26 anos, mas foi no Lubango onde se formou no Instituto Politécnico da Huíla., tendo no ano passado concluído a parte teórica em engenharia de minas.
“ Terminei a minha formação no ano passado e graças a Deus tive a sorte de conseguir fazer o meu estágio nesta empresa ”, conta o entrevistado, que diz estar a “conciliar a teoria à prática”.
Visivelmente satisfeito revela que tem estado a aprender muito no seu dia-a-dia, sobretudo nas diversas áreas de trabalho. “ Quando não tenho tarefas na minha área da pesquisa, vou à pedreira aprender sobre os blocos, sua qualificação e o corte das rochas”.
Germano diz que pretende obter o maior número possível de conhecimentos, com vista a ter uma formação sólida e polivalente, nas diversas áreas da empresa.
O jovem engenheiro estagiário está confiante que venha a ser admitido depois de concluir o estágio, tendo aproveitado a ocasião para encorajar os seus antigos colegas de carteira para que não desistam até conseguirem um emprego no ramo em que se formaram.
Leandro Francisco, 29 anos, é mecânico na empresa há 3 anos. É natural da Huíla, reside no Lubango onde tem a família, que visita no final de cada semana. Diz ser dispendioso fazer diariamente o trajecto de ida e volta até ao município sede da Huíla.
Afirma que o trabalho tem decorrido “ normalmente” e que tem estado a aperfeiçoar os seus conhecimentos.
Questionado sobre as condições de trabalho, afirmou que eram “normais” e que não tinham razões de queixa.
Em relação à assistência médico-sanitária, revelou que em caso de doença, ele e os seus colegas têm recorrido, numa primeira fase, ao centro de saúde da comuna da Tchimbemba.
Falta de condições e salários em atraso na “ Angostone”
Se a Rodang constitui um modelo em matéria de organização, possui estaleiros aceitáveis, equipamentos e condições laborais, o mesmo não se pode dizer da Angostone, que dá sinais de degradação.
Salta à vista desarmada de qualquer visitante o equipamento obsoleto usado na perfuração e corte das rochas, as avarias constantes das máquinas e as más condições de trabalho de uma empresa que tem estado em queda livre nestes últimos cinco anos.
Os estaleiros e o espaço onde se procede à confecção dos alimentos não são agradáveis, pelo que requerem investimentos para reverter o estado que se apresentam.
A Angostone está reduzida a uma força de trabalho de 9 elementos, que lamentam os atrasos no pagamento dos salários, da má qualidade da alimentação, da falta de equipamentos de protecção, assim como de férias não remuneradas.
Esta empresa, à semelhança da Rodang, não dispõe de energia da rede pública, pelo que depende de geradores para o funcionamento dos equipamentos.
Tchapona Luatelecu, 40 anos, operador da única máquina giratória, está há um ano na empresa. Diz que inicia o trabalho às 7 horas e larga às 17 horas, pelo meio tira hora e meia para o almoço (das 12 às 13 horas e 30 minutos).
Ele, não só se queixa das más condições de trabalho, sobretudo dos equipamentos de protecção individual, nomeadamente luvas, máscara, capacete e auscultadores, como também dos salários que, segundo ele, não são pagos “ há dois meses”.
Diz que aprendeu a operar a “giratória” na empresa SOCOIL e que aufere um salário líquido de 140 mil Kwanzas.
Queixa-se da qualidade da alimentação que, segundo o entrevistado, tem sido sempre frango com arroz .
Questionado sobre se a empresa possuía uma estrutura sindical, disse que não, e que não dispunha de assistência médica e medicamentosa, em caso de doença.
Tchapona é natural da Chibia, um dos municípios da Huíla, para onde viaja todos os fins-de-semana para “ ver a família e matar saudades”.
Confrontado com as denúncias, António de Brito, 40 anos, encarregado da pedreira, confirmou os atrasos salariais, tendo assegurado que os mesmos já tinham sido processados e que os pagamentos seriam feitos nas “próximas horas”.
Em relação à falta de equipamentos de protecção, alegou que tinham sido distribuídos aos trabalhadores, mas que eles optavam por deixá-los nos dormitórios.
Lamentou a falta de energia da rede pública e os elevados gastos com os combustíveis para os geradores que garantem o funcionamento das máquinas.
Sobre as máquinas que procedem ao corte das rochas, admitiu que as mesmas têm sofrido avarias constantes devido à sua antiguidade.
Na altura em que a nossa equipa se encontrava no terreno um electricista acabava de proceder à reparação de umas das máquinas de corte de rochas.
Centro de Saúde da Tchibemba
Inaugurado em 2013, no âmbito do PIP (Programa de Investimentos Públicos), o Centro de Saúde da Tchimbemba tem capacidade para o internamento de 23 pacientes, dispondo de um pequeno laboratório e sala de partos.
Segundo deu a conhecer o seu director, Alcino Baptista, na pequena unidade de saúde estavam internados 4 doentes.
Apontou a malária, as diarreias agudas, as doenças de foro respiratório e a conjuntivite como as doenças mais frequentes na comuna.
Deu a conhecer que o centro tem sensibilizado os habitantes para se prevenirem de doenças como o paludismo e as diarreias agudas, com a distribuição gratuita de desinfectantes para a água.
Em relação à energia disse que o centro recebia iluminação da rede pública das 17 horas até à meia-noite. Lamentou, porém, o facto de o gerador encontrar-se avariado desde Novembro último, o que tem afectado o funcionamento do centro.
Revelou que o centro não possui nenhuma ambulância para o transporte de doentes, mas que tem recebido pontualmente o apoio do hospital dos Gambos, que dispõe de duas viaturas para esse fim.
Por se tratar de uma região com intensa actividade mineral, questionado sobre se algumas das doenças descritas estavam relacionadas com a prospecção e extracção de inertes, afirmou que não se podia estabelecer uma relação de causa/efeito, por falta de estudos aprofundados nesse domínio.
Admitiu que entre os pacientes que acorriam ao centro, muitos deles eram trabalhadores das empresas de mineração.
Questionado sobre a existência de medicamentos, Alcino Baptista revelou que o centro dispunha dos principais fármacos, nomeadamente anti-palúdicos e antibióticos. “ Às vezes, temos tido rupturas de stock, já que dependemos do hospital municipal dos Gambos”.
À pergunta sobre se as empresas de exploração de inertes têm cumprido com as suas responsabilidades sociais, o responsável respondeu favoravelmente. “Quando necessitamos de água ou combustível para o nosso gerador, ou limpar o capim à volta do centro, temos recebido o apoio dessas empresas que nos enviam os seus equipamentos”, sem no entanto citar nomes.